"Consentimento informado é relativo", afirma geneticista

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA 

Para o geneticista gaúcho Francisco Salzano, ex-aluno e colaborador de James Neel por cinco décadas, a coleta de sangue dos ianomâmis foi feita "de modo absolutamente ético".
O pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul participou das coletas em 1967 e diz que não faria nada diferente se tivesse de repeti-las.
"Esse material é precioso para a nossa história", afirma, lamentando a sua devolução.
Neel e seus colegas tinham em mente uma série de questões científicas que poderiam ser respondidas com a análise do sangue e do DNA indígena.
Uma delas era estudar a microevolução humana, ou seja, o impacto do isolamento geográfico entre os grupos ianomâmis na sua diferenciação genética.
O DNA da tribo também foi usado para ajudar a mapear a migração do homem para a América, na Era do Gelo.
Outro objetivo, menos nobre, era usar os ianomâmis como grupo controle para analisar mutações genéticas em sobreviventes da bomba atômica.
Salzano diz que ainda havia muito o que aprender com as amostras e que só uma parte muito pequena do DNA foi sequenciada. "Quando se desenvolveram novas técnicas genômicas é que houve o embargo."
O pesquisador, de 81 anos, rebate as acusações de que não houve esclarecimento -o chamado consentimento informado- aos índios na época.
"Consentimento informado é relativo em qualquer grupo marginal, até mesmo urbano", afirma, explicando que não é possível esperar que esses grupos entendam o que a ciência planeja fazer com o DNA deles.
"Todo mundo tem direito ao seu DNA. Se os sujeitos de investigação se recusam, é uma posição que eu considero errônea, mas temos de respeitar."
Em nome de pesquisas que trariam o suposto "bem comum", cientistas acabam em atoleiros éticos. Nos anos 1990, um projeto do geneticista Luigi Luca Cavalli-Sforza de mapear a diversidade do genoma humano foi a pique sob acusações de índios e antropólogos -e o apelido de "Projeto Vampiro".
Na mesma década, foi a vez de antropólogos dos EUA se engalfinharem com uma tribo em torno do crânio do Homem de Kennewick, o mais antigo do país. Os índios queriam enterrar o fóssil de 9.000 anos, considerado por eles um ancestral, mas a Justiça deu ganho de causa aos pesquisadores.

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sangue

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ANDREA MURTA
DE WASHINGTON para Folha de São Paulo

Uma proposta de acordo enviada pelo governo brasileiro em março a cinco centros de pesquisa americanos está prestes a resolver uma polêmica mundial que começou há mais de quarenta anos entre geneticistas e antropólogos estrangeiros e índios ianomâmis.
A disputa tem origem em 1967, quando equipes lideradas pelo geneticista James Neel e pelo antropólogo Napoleon Chagnon recolheram milhares de amostras de sangue ianomâmi no Brasil e na Venezuela.

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DA REDAÇÃO (Folha de São Paulo)

Os ianomâmis sabem direitinho o que fazer com as mais de 2.000 amostras de sangue coletadas por James Neel e colegas quando elas voltarem a Roraima. Chamarão os velhos, chorarão pelos parentes mortos e despejarão tudo no rio.
Os índios acham inconcebível que partes de pessoas que não existem mais ainda possam estar zanzando por aí, trancafiadas em geladeiras a milhares de quilômetros de distância.
Não há lugar para a permanência dos mortos na Terra na visão de mundo ianomâmi. As cinzas dos parentes são misturadas a comida ou bebida para que não sobre nada do finado. Seu nome nunca mais é mencionado.
"É a maneira como você constrói a separação entre o mundo dos mortos e o dos vivos", diz o antropólogo Bruce Albert, da Comissão Permanente Pró-Yanomami, em depoimento no filme "Napëpë" (2004), da antropóloga Nadja Marin. "Se você não faz isso, os mortos voltam e ficam perseguindo os vivos."
Albert e o líder Davi Kopenawa Yanomami foram os principais responsáveis pela ação do Ministério Público junto aos EUA para a devolução das amostras.
Ambos estavam na Alemanha na semana passada e não responderam a pedidos de entrevista da reportagem.
Para Davi Yanomami, os cientistas não disseram o que seria feito com o sangue -só que as pesquisas trariam benefício. "Em parte vacinaram para sarampo, mas sangue eles não falaram, não."
Albert chama a coleta de "biopirataria". "Um dia [o DNA] pode ser explorado comercialmente, sem que os ianomâmis possam controlar qualquer coisa." (CA)

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